Na sociedade moderna e em nossa vida cotidiana, muitas vezes somos levados a acreditar que existe uma “opinião pública” que pode influenciar a política, nosso comportamento e as nossas vidas.
No entanto, o sociólogo francês Pierre Bourdieu nos faz refletir sobre essa noção amplamente aceita em seu livro provocativo intitulado "A Opinião Pública Não Existe". Para começar, Bourdieu argumenta que a opinião pública não é um produto natural ou espontâneo da sociedade, mas sim uma construção social trabalhada por diversas forças e instituições.
Em vez de ser um reflexo direto das opiniões individuais, a opinião pública é moldada e manipulada por uma variedade de fatores, incluindo a mídia, o poder político e econômico, e até mesmo as classes sociais.
Ele desconstrói as pesquisas de opinião e nos conduz a entender que a opinião pública não existe, pelo menos não como essas pesquisas tentam mostrar. Uma das críticas que ele faz é que a opinião sobre algo não está ao alcance de todos. Tomando a música como exemplo, a pessoa para ter uma opinião sobre ela tem que ter estudado música. Um outro ponto que ele chama a atenção, é que mesmo estudiosos de música, com gostos diferentes e outras culturas, terão opiniões diferentes. E segundo sua teoria, o mais grave nessas pesquisas, é que as pesquisas partem da categoria dos pesquisadores e isso torna difícil a veracidade dos dados coletados, porque as pessoas vão ler as questões e vão reinterpretá-las conforme seus gostos e opiniões. Assim sendo, nem sempre as respostas de fato é o que os pesquisados pensam. Então, as pesquisas de opinião são complexas e para serem mais confiáveis precisam ser mais científicas. Bourdieu reprova a ideia de que todas as opiniões têm o mesmo valor ou peso, ele diz que isso é falso e que o acúmulo de opiniões desiguais não pode ser a representação real da opinião pública.
Ele questiona sobre quais questões são importantes o suficiente para serem incluídas em pesquisas de opinião, argumentando que essa abordagem pode excluir pontos de vistas importantes e que são deixados de lado. Além disso, Bourdieu aponta vários fatores nas pesquisas de opinião, como problemas de representação das amostras, formulação tendenciosa de perguntas e respostas, e a falta de previsão de todas as possíveis respostas. Ele sugere que essas distorções prejudica oresultado final das pesquisas de opinião, mesmo quando são seguidas todas as condições do método utilizado.
Outro ponto levantado por Bourdieu é o papel central da mídia na formação da chamada opinião pública. Ele argumenta que os meios de comunicação têm o poder de selecionar e “maquiar” as informações que chegam ao público, influenciando assim a percepção e a crença das pessoas. Além disso, Bourdieudestaca como a concentração de propriedade na mídia pode levar a uma homogeneização das mensagens transmitidas, restringindo assim a diversidade de opiniões que existem.
Ele destaca também a relação entre poder e opinião pública, sugerindo que os que possuem acesso aos recursos políticos e econômicos têm a capacidade de influenciar as agendas públicas e induzir aspercepções das massas. Isso pode ocorrer através de estratégias de lobby, propaganda e manipulação da informação, todas com o intuito de promover alguns interesses em detrimento de outros.
Indo além, Bourdieu argumenta que a própria noção de opinião pública é muitas vezes usada como ferramenta de controle social. Convencendo as pessoas de que existe uma "opinião pública" que deve ser seguida e respeitada, os poderes dominantes podem legitimar suas ações e desencorajar os que ousam desafiá-la. Isso cria uma ilusão de consenso e uniformidade, mesmo quando a realidade é muito mais complexa e diversificada.
A teoria de Bourdieu nos leva a fazer uma análise mais profunda com um olhar mais crítico para formarmos nossas próprias opiniões, melhorando anossa compreensão da opinião pública,reconhecendo as forças sociais e políticas que a moldam, em vez de aceitarmos passivamente as narrativas dominantes. Somente assim, poderemos verdadeiramente exercer nossa autonomia e contribuir para um debate público mais justo e inclusivo.
Roberto Barcelos
Fotógrafo e acadêmico de Jornalismo da Unemat.