O presidente Luiz Inácio Lula da Silva entrou em campo para estancar a crise entre o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF). Em um gesto de pacificação entre os Poderes, Lula promoveu um jantar na quinta-feira (23) no Palácio da Alvorada, para os ministros Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Cristiano Zanin. Aos convidados, sinalizou que vai indicar à Procuradoria-Geral da República (PGR) o vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet, apadrinhado por Moraes e Gilmar. A PGR está sob o comando interino de Elizeta Ramos há dois meses, desde que Augusto Aras deixou o cargo. O procurador-geral é indicado pelo presidente da República e avalizado em votação do Senado.
Afago
As cúpulas do Executivo e do Judiciário entraram em rota de colisão na quarta-feira, após o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), votar a favor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita as decisões monocráticas dos magistrados da Corte. No Palácio do Planalto, a sinalização de que Paulo Gonet será indicado para a PGR foi entendida como o grande afago de Lula a Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, e com a capacidade de reconstruir as pontes dinamitadas por Jaques Wagner.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, não participou do jantar da pacificação. Ele já havia se reunido com Lula na manhã de quinta-feira e viajou para o Rio naquela noite, em razão de um compromisso previamente agendado, e por isso não pôde comparecer.
Ao longo do encontro no Alvorada, o presidente afirmou aos convidados que não orientou Jaques Wagner - que, além de líder do governo, é seu amigo pessoal de 4 décadas - a aliar-se aos bolsonaristas e ao Centrão no voto “sim” à PEC. O apoio do senador foi considerado decisivo, no Supremo e no governo, para o avanço do texto, que agora segue para análise da Câmara. Wagner “arrastou” consigo os votos dos aliados Angelo Coronel (PSD-BA) e Otto Alencar (PSD-BA), dando a margem necessária para o texto passar na Casa. Antes do voto de Wagner, a aposta do Supremo é que a PEC não seria aprovada pelo Senado.
Os ministros da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, e da Justiça, Flávio Dino, acompanharam o jantar promovido por Lula. Os dois são cotados para a vaga aberta no STF e têm diálogo com os ministros da Corte. Dino é o candidato favorito de Moraes e Gilmar, enquanto Messias tem o apoio do PT. Corre por fora o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, que tem bom trânsito entre os Poderes, mas perdeu competitividade ao longo da corrida de bastidores.
Pressão
Mas se Gilmar e Moraes, de fato, emplacarem Gonet na PGR, o PT promete dobrar a pressão para o chefe da AGU ser indicado ao Supremo, sob pena de dar muito poder aos magistrados. O partido de Lula defendia o subprocurador Antonio Carlos Bigonha para comandar o Ministério Público. No entorno de Lula, a indicação de Paulo Gonet para a PGR é esperada para os próximos dias. Já definição para o STF é esperada somente para o ano que vem.
O jantar oferecido aos magistrados foi avaliado por auxiliares políticos do governo como exitoso para, ao menos, baixar a fervura da crise institucional. Já no dia seguinte, Luís Roberto Barroso marcou para a segunda-feira o julgamento da mudança de contabilidade dos precatórios, pauta de interesse do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. No auge da irritação do Supremo com o voto de Jaques Wagner, a equipe econômica dizia nos bastidores temer que os magistrados poderiam reagir ao governo atrasando a análise da matéria.
Precatórios
A equipe econômica pede ao STF autorização para que os juros dos precatórios sejam considerados despesas financeiras, ou seja, não sejam contabilizados na meta fiscal e nem nas punições do arcabouço. A medida seria um alívio para Haddad, que apesar do cenário econômico desafiador ainda persegue a meta de déficit fiscal zero em 2024.
Outro pedido na mesma ação protocolada pela União é para o STF autorizar o pagamento de R$ 95 bilhões do estoque de precatórios via crédito extraordinário ainda em 2023.
Ponto de inflexão na relação entre o governo e o Supremo, que vinham alinhados pela ação do Judiciário contra o bolsonarismo, a PEC que limita as decisões monocráticas dos magistrados foi patrocinada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em dobradinha com o presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP).
Enquanto Pacheco busca se viabilizar como pré-candidato ao governo de Minas Gerais, com acenos ao eleitorado de direita favorável a um “freio” ao Supremo, Alcolumbre constrói uma rede de apoios dentro do Senado para voltar à presidência do Congresso em 2025. Ex-presidente da Casa, Alcolumbre trabalha para ser um “candidato invencível” à sucessão de Pacheco. Para isso, quer o apoio do Planalto, do Centrão e do bolsonarismo raiz.