O Congresso Nacional, reunido em sessão conjunta nesta quinta-feira (14), derrubou o veto do presidente Lula (PT) ao projeto de lei que estabelece o Marco Temporal para a demarcação de terras indígenas no Brasil.
A votação foi dividida, primeiro entre os deputados federais e posteriormente apenas entre os senadores. Entre os deputados, o placar foi de 321 votos a 137 pela rejeição do veto. Já entre os senadores, o placar foi de 53 contra 19, pela derrubada do veto. Agora o texto vai à promulgação.
A derrubada do veto é uma derrota para o Governo Federal. Agora, passa a valer a tese segundo a qual os povos indígenas só terão direito à demarcação das terras que já eram tradicionalmente ocupadas por eles no dia da promulgação da Constituição.
É esperado, contudo, que o Governo Federal recorra ao Supremo Tribunal Federal para rever a decisão. Em setembro, o STF havia chegado ao entendimento de que o Marco Temporal era inconstitucional.
Entre os principais trechos vetados, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva proibiu a indenização aos produtores rurais que perderem suas terras com a nova demarcação, uma das principais preocupações da bancada ruralista. Lula também proibiu a produção agrícola nas novas terras demarcadas e a construção de estradas, reinvindicações feitas pelos próprios indígenas, especialmente os de Mato Grosso.
Mas agora, com a derrubada do veto, todas essas regras passam a valer.
Como votou a bancada de Mato Grosso:
Carlos Fávaro - para derrubar o veto
Jayme Campos - para derrubar o veto
Wellington Fagundes - para derrubar o veto
Abílio Brunini - para derrubar o veto
Coronel Assis - para derrubar o veto
Coronel Fernanda - para derrubar o veto
Amalia Barros - para derrubar o veto
Emanuelzinho Pinheiro - para manter o veto
Juarez Costa - para derrubar o veto
José Medeiros - para derrubar o veto
Gisela Simona - para derrubar o veto
O que havia sido vetado:
- a obrigatoriedade de comprovação dos requisitos que definem o que são terras tradicionalmente ocupadas 'baseada em critérios objetivos';
- a obrigatoriedade da participação dos estados e municípios e partes interessadas na demarcação de uma área indígena;
- a obrigatoriedade da intimação dos interessados desde o início do processo de demarcação e a permissão da indicação de peritos auxiliares;
- a obrigatoriedade de contraditório e defesa aos interessados desde os estudos preliminares do processo de demarcação.
- a obrigatoriedade de indenizar as benfeitorias realizadas nas áreas em disputa;
- a permissão para que não-indígenas, que tivessem posse da área demarcada, pudessem usufruir da terra objeto da demarcação até que fosse concluído o procedimento demarcatório e indenizadas as benfeitorias;
- a proibição de ampliar terras indígenas já demarcadas;
- a possibilidade de contato com povos indígenas isolados para 'prestar auxílio médico ou para intermediar ação estatal de utilidade pública';
- a retirada de trecho da Lei 11.460/2007 que proíbe o cultivo de alimentos transgênicos em terras indígenas;
- a possibilidade da União tomar as terras novamente caso os traços culturais da comunidade indígena tenha sido modificada com o passar do tempo;
- a criação do conceito de "áreas indígenas adquridas", por meio de compra, venda ou doação;
- a permissão de instalação de bases e postos indígenas ou ao órgão indigenista;
- a possibilidade de operações das Forças Armadas e da Polícia Federal em áreas indígenas sem que as comunidades sejam consultadas;
- a permissão de instalação de estradas, redes de comunicação e outros equipamentos em terras indígenas;
- a determinação de que os antropólogos, peritos e outros profissionais especializados, nomeados pelo poder público, e cujo trabalho fundamentem a demarcação, fosesem submetidos às regras do Código de Processo Civil que trata sobre suspeição e impedimento;
- a permissão de turismo em terras indígenas, organizado pela própria comunidade, e com a possibilidade de contratos para captar investimentos;
- determinação de que o usufruto por indígenas em terras indígenas localizadas em unidades de conservação deveria ficar sob a responsabilidade do órgão federal gestor da área protegida.
O que já estava em vigor:
- determinação de que cabe às comunidades indígenas escolher a forma de uso e ocupação das terras mediante "suas próprias formas de tomada de decisão e solução de divergências";
- estabelecimento de que que o usufruto das terras indígenas não se sobrepõe ao interesse da política de defesa e soberania nacional;
- determinação de que não-indígenas só poderão entrar nas terras caso sejam autorizados pela comunidade indígena e por agentes públicos a serviço de União, estados e municípios;
- direito das próprias comunidades explorarem economicamente as terras indígenas, permitindo cooperações e contratações de não-indígenas.
- Segundo o governo, não é permitida qualquer atividade econômica na qual os indígenas percam a gestão da área, a exemplo do arrendamento de terras para agricultura e pecuária;
- a previsão de que o processo de demarcação será público e com atos "amplamente divulgados" e divulgados para consulta online;
- a previsão de que qualquer cidadão pode ter acesso às informações relativas a demarcações de terras indígenas, inclusive estudos, laudos, conclusões e argumentações;
- informações orais citadas no processo de demarcação terão efeito de prova quando apresentadas em audiências públicas ou registradas em áudio e vídeo, com a devida transcrição;
- direito das partes interessadas no processo de receber tradução oral ou escrito da língua indígena para o português e vice e versa, por tradutor nomeado pela Funai;
- permissão para que associações representem seus associados nos processos, desde que haja aprovação em assembleias gerais das instituições;
- previsão de que o levantamento fundiário da área em discussão seja acompanhado de relatório circunstanciado;
- autorização para que o governo federal, com órgão competente, entre em propriedade particular para levantar dados e informações, mediante comunicação prévia e por escrita ao proprietário ou representante com antecedência mínima de 15 dias úteis.