De acordo com a ONG Criança Segura, que faz parte da rede global de prevenção de acidentes na infância, mais de 03 mil crianças entre 0 a 14 anos morrem vítimas de acidentes no Brasil todo ano. Esses acidentes estão relacionados as mais diversas causas, sendo as principais: os acidentes de trânsito, afogamentos, sufocações, acidentes com armas de fogo, entre outros.
Conforme levantamento feito pela ONG, em primeiro lugar das causas relacionadas a acidentes estão os acidentes de trânsito, o qual as crianças predominantemente estão na condição de ocupantes de veículos e depois na condição de pedestres que sofrem atropelamentos.
Frente a esse cenário preocupante, o Código de Trânsito Brasileiro – CTB, por meio do Artigo 64 do Capítulo das Normas Gerais de Circulação e Conduta, recentemente modificado pela Lei 14.071 de 2020 que alterou partes do CTB, dá um destaque especial para o transporte de crianças em veículos, na conhecida “Lei da Cadeirinha”.
Antes das alterações da Lei de 2020, o Artigo 64 previa que as crianças com idade inferior a dez anos deveriam ser transportadas nos bancos traseiros, salvo exceções regulamentadas pelo CONTRAN.
O artigo era bem genérico e deixava a cargo do CONTRAN toda e qualquer exceção relacionada ao transporte de crianças menores de 10 anos. Tais previsões foram ao longo do tempo regulamentadas pelas Resoluções 15/1998, que previa que crianças menores de 10 anos deveriam ser transportadas nos bancos traseiros e usar, individualmente, cinto de segurança ou sistema de retenção equivalente. Sem, no entanto, descrever o que seriam os dispositivos de “retenção equivalentes”.
A regra admitia menores de 10 anos serem transportados no banco dianteiro quando a capacidade exceder a lotação do veículo, devendo atentar para que o de maior estrutura possa ocupar a vaga no banco dianteiro, entre outras normas. O regramento detalhado veio apenas no ano de 2006, por meio da Resolução 277/2006 e com isso, revogou a anterior. Nessa Resolução descrevia o que se entende por dispositivo de retenção, especificando o que é bebê conforto, cadeirinha auxiliar, dispositivo de elevação e destacando as idades para uso.
A regra abria exceção, assim como na Resolução anterior a possibilidade de transportar criança de maior estatura no banco dianteiro quando o limite de crianças transportadas no veículo exceder a capacidade do banco traseiro. A regra permitia também, que veículos que tenham exclusivamente assentos dianteiros possam transportar as crianças nesses bancos, desde que façam uso do dispositivo de retenção relacionado a idade, entre outros regramentos.
Ao longo dos anos a Resolução sofreu diversas modificações. Mas só foi revogada este ano, por meio da Resolução 819/2021, que trouxe adequações devido à mudança do CTB. Com a nova legislação já em vigor, o Art. 64 do CTB passa a vigorar que as crianças com idade inferior a 10 anos que não tenham atingido 1,45m de altura devem ser transportadas nos bancos traseiros, em dispositivo de retenção adequado para cada idade, peso e altura, salvo exceções relacionadas a tipos específicos de veículos regulamentados pelo CONTRAN.
Vale ressaltar duas observações importantes em relação à alteração do Artigo 64, a primeira é a fixação em lei da necessidade do dispositivo de retenção, que antes deixava a cargo apenas do CONTRAN. E a segunda observação fixada na nova regra é crianças com idade inferior a 10 anos e que não tenham atingindo a altura de 1,45 m, devem ser transportados no banco traseiro do veículo, a regra anterior falava apenas a idade e não a altura.
Ao Artigo 64 foi acrescentado também o parágrafo único, que especifica que o CONTRAN disciplinará o uso excepcional de dispositivos de retenção no banco dianteiro do veículo e as especificações técnicas dos dispositivos de retenção. Tal assunto, como mencionado, passou a ser tratado na Resolução 819/2021, que disciplinou o uso dos dispositivos de segurança adequados ao cumprimento do transporte de crianças em veículos. Entre os principais apontamentos da Resolução, destaca-se a necessidade de as crianças serem transportadas nos bancos traseiros de forma individual, usando cinto de segurança ou dispositivo de retenção equivalente.
Em relação às exceções tratadas na Resolução, os veículos de transporte coletivo, de aluguel, de transporte remunerado, escolares e demais com peso bruto total superior a 3,5t, não estão sujeitos às exigências do uso obrigatório do sistema de retenção para crianças de até 07 anos e meio.
Quanto a permissão de transporte de crianças com idade inferior a 10 anos no banco dianteiro, poderá ocorrer nos casos em que o veículo for dotado exclusivamente de bancos dianteiros (como é o caso de veículos modelo utilitário: pick ups, caminhonetes cabine simples, etc.); também se permite no caso de a quantidade de crianças com esta idade exceder a lotação do banco traseiro; ou quando o veículo for dotado originalmente (fabricado) de cintos de segurança subabdominais (dois pontos) nos bancos traseiros; ou quando a criança já tiver atingido 1,45m de altura.
A regra destaca ainda, em veículos equipados de airbag para o passageiro do banco dianteiro, o transporte de crianças com até dez anos de idade neste banco podem ser realizados desde que utilizado o dispositivo de retenção adequado ao seu peso e altura. Vale lembrar que é vedado o transporte de crianças com até sete anos e meio de idade, em dispositivo de retenção posicionado em sentido contrário ao da marcha do veículo. Além disso, o condutor deve seguir as especificações do fabricante do veículo.
Os dispositivos de retenção são definidos no Anexo da Resolução, podendo ser o “bebê conforto” para crianças de até 01 ano de idade ou com peso de até 13 kg; a “cadeirinha” para crianças com idade superior a 01 ano até 04 anos, ou com peso de 09 a 18 kg; pode ser ainda o “assento de elevação” para crianças com idade superior a 04 anos e até 07 anos, ou com altura de até 1,45m e peso entre 15 a 36 kg. Por fim, temos ainda o uso do cinto de segurança que se aplica a crianças com idade superior a 7 anos e meio e até 10 anos, ou criança com altura superior a 1,45 m. O não cumprimento do Artigo 64 do CTB em conjunto com a Resolução 819/2021 ficam sujeitas as sanções previstas no art. 168 do CTB. Que prevê multa de natureza gravíssima, 07 pontos, na CNH, valor de R$ 293,47, com medida administrativa de retenção do veículo no local para regularização.
Diante de tantas normativas, no findar das nossas discussões, fica a reflexão que a estatística de mortalidade infantil é refletida no nosso trânsito ainda violento, é possível afirmar que o adulto é o principal responsável por esses altos números e mortes de crianças no trânsito, já que, as crianças não possuem e não dirigem os meios de transporte, ou são transportadas por adultos ou a pé.
É relevante realçar que as crianças enquanto pedestres têm um nível de atenção menor, um senso de percepção baixa em relação ao perigo, são muito mais frágeis e suscetíveis a traumatismo em caso de acidentes tanto quando estão nos veículos ou transitando pela via.
Com isso, os dispositivos de retenção assumem um importante papel em aumentar a segurança e integridade física das crianças em veículos. O cinto de segurança que é comprovadamente um dispositivo que ajuda a salvar vidas em caso de acidentes, ganha um reforço com o uso dos dispositivos, já que as crianças ainda não têm o tamanho adequado para usá-lo sem a necessidade dos dispositivos auxiliares.
O uso dos dispositivos de retenção, juntamente com a atenção e cumprimento das regras de trânsito, diminuem a possibilidade de acidentes fatais e ferimentos de maiores proporções às crianças.
Sendo fundamental para a segurança dos pequenos, por isso, não coloque a vida dos seus filhos em risco.
Isso é Trânsito em movimento!
Sobre a autora: Cláudia Regina Soares é tenente-coronel da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso, Mestre em ESTUDOS LITERÁRIOS pela UFMT, possui Graduação militar CFO/PMMT e graduação em Letras/UFMT. Pós-graduação na área militar em CAO e CSP, ambos pela APMCV/UNEMAT, estudante de DIREITO na UNEMAT, possuem diversos cursos na área de legislação de trânsito. É docente desde 2003 na Academia de Polícia Militar de Mato Grosso e na Escola Superior Formação de Praças da PMMT na área de Legislação, Educação e Policiamento de Trânsito. É autora do canal virtual Trânsito em Movimento e Curiosidades em Trânsito. Atualmente exerce a função de Comandante da 9° CIPM de Diamantino e Região.